– Lamentavelmente, estamos impedindo que uma pessoa lute pela vida! Disse o Desembargador ao negar medicamento


“É muito difícil dar provimento a esse recurso, mas o STJ não nos dá abertura. É um caso grave e o medicamento ajudaria muito a paciente,mas nossos Tribunais Superiores não são sensíveis à causa. Lamentavelmente,estamos impedindo que uma pessoa lute pela vida”.

Saúde é privilégio. Muitos só dão o real valor à saúde, quando ela vem a faltar ou ameaçar faltar!

Sim, você já viu aqueles casos em que os médicos suspeitam de uma patologia grave e mandam o paciente fazer um exame minucioso para checar se suas conspirações procedem, hein? Até descobrir que não era nada demais, o sujeito treme nas bases.

Gozar da delícia de ser associado a um plano de saúde, não deixa de ser, na atual conjuntura econômico-financeira do pacato cidadão, um privilégio tremendo. Só sabe o real valor de ser associado a um plano de saúde, quem já desfrutou dos serviços do Sistema Único de Saúde,o velho SUS, e agora, alegre, segue, celebrando a conquista.

O associado paga caro pelo serviço contratado; há quem chegue a contar as moedas para poder manter o padrão, e seguir sua vida, pois, para ele, saúde é o que interessa… O resto…

O que não se espera é que o médico venha a descobrir, de uma hora para outra, que o paciente está com uma enfermidade ‘daquelas’, que só um milagre, ou um remédio, ainda que importado ou experimental, possa salvá-lo.

É aí que começa o perrengue, a briga de gato e rato entre operadoras de planos de saúde e os beneficiários, fazendo com que a desavença desague nos braços do Judiciário.

Nesta questão, há um novo entendimento que tem mexido com os ânimos de muitos: A não concessão de medicamentos não registrados pela Agência Nacional de Saúde, a conhecida, Anvisa.

É que em Novembro de 2018, a Segunda Seção do STJ (Superior Tribunal de Justiça) analisando os Recursos Especiais – REsp 1.712.163 e 1.726.563 entendeu que não há obrigação do plano de saúde fornecer medicamento não registrado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA.

Naquela ocasião, segundo trecho constante em reportagem que li, nos recursos julgados, o Ministro Moura Ribeiro asseverou que a Defensoria Pública havia solicitado que os processos fossem apreciados no STJ:

Sustentando a DP que o Judiciário deveria compelir as operadoras ao custeio de medicamentos mesmo não registrados, considerando a mora na apreciação do pedido de registro, que deveria ter prazo razoável. Mas a ocorrência de atrasos pode encontrar justificativa na complexidade do procedimento-padrão. Não há como o Poder Judiciário atropelar todo o sistema sob pena de causar mais malefícios que benefícios. Não pode o Poder Judiciário criar norma sancionadora. A justa expectativa do doente não implica sua automática viabilidade de consumo. Além disso, é possível a responsabilidade civil por omissão da agência reguladora, sendo auferida em ação própria”.

Após este alerta, a decisão do colegiado foi unânime.

Pois bem.

O tempo passou, as operadoras de planos de saúde, obviamente, celebraram. O povo continuou a ficar doente e carecer de remédios importados, ou até nacionais, mas ainda não registrados pela ANVISA.

Entra em cena, de novo, o anseio do cidadão e as demandas pleiteando remédios que poderiam, quem sabe, salvar uma, ou dezenas de vidas.

Avaliando o processo 2073004-75.2019.8.26.0000 que tramitou no TJ-SP, muito me chamou a atenção o discurso do Desembargador Relator Rodolfo Pelizzari, ao sinalizar:

– “É muito difícil dar provimento a esse recurso, mas o STJ não nos dá abertura. É um caso grave e o medicamento ajudaria muito a paciente, mas nossos tribunais superiores não são sensíveis à causa. Lamentavelmente, estamos impedindo que uma pessoa lute pela vida“.

Fico imaginando o conflito existencial vivenciado pelo ilustre Desembargador ao ser obrigado a negar medicação à paciente que está com câncer: ter que seguir e fazer uso de uma tese que não concorda!

Na mesma hora me bate um alerta:

– Ops, nem tudo são flores na caminhada de qualquer profissional, amiga; ainda que seja uma autoridade judiciária.

Acredito que você, caro leitor, possa estar se perguntando:

– E se o TJSP ou qualquer um outro Tribunal Estadual ignorasse as regras impostas pelo STJ e deferisse que o plano de saúde fosse obrigado a conceder a medicação não registrada, o que poderia vir a ocorrer?

Eis a resposta, companheiros:

– O caos estaria instalado, pois os Tribunais Estaduais, através dos seus juízes e desembargadores, têm o dever legal de seguirem as normas e regras impostas pelos Tribunais Superiores, podendo, em caso de incontinência, sofrerem “Reclamações” registradas no próprio STJ.

Então, a cautela e prudência mandam que acatem as disposições legais impostas pelos Tribunais Superiores, mesmo que se discorde de algum conteúdo.


Fátima Burégio
Especialista em Processo Civil, Responsabilidade Civil e Contratos

Publicado em 23/07/2019

Artigo original: https://fatimaburegio.jusbrasil.com.br/artigos/734317255/lamentavelmente-estamos-impedindo-que-uma-pessoa-lute-pela-vida-disse-o-desembargador-ao-negar-medicamento?utm_campaign=newsletter-daily_20190722_8707


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