Wall Street Journal: ‘A volta de Lula e a ameaça judicial à democracia brasileira’

Lula

O ex-presidente esquerdista assume novamente o cargo em 1º de janeiro, enquanto a Suprema Corte tenta limitar o poder do Congresso.

O presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio “Lula” da Silva, toma posse em 1º de janeiro, iniciando seu terceiro (não consecutivo) mandato de quatro anos. Como um autodenominado defensor dos pobres, ele enfrenta o desafio das baixas previsões de crescimento para os próximos dois anos e a pressão inflacionária causada por gastos excessivos do governo.

No entanto, mesmo antes do dia da posse, da Silva – um co-fundador com o falecido Fidel Castro do Fórum de extrema-esquerda de São Paulo – está telegrafando sua intenção de deixar os gastos públicos rasgarem, deter a privatização e reverter as reformas destinadas a conter a corrupção. Moderados que apoiaram sua candidatura, como o ex-presidente do Banco Central e falcão fiscal Armínio Fraga, parecem surpresos. Em entrevista à Globo News em novembro, Fraga disse: “Não me arrependo do meu voto, mas estou preocupado”.

Junte-se à multidão.

Infelizmente, um presidente populista do Partido dos Trabalhadores prometendo abrir caminho para a prosperidade nacional não é a única coisa que os brasileiros temem. Uma ameaça maior é a Suprema Corte de 11 membros, que está extrapolando sua jurisdição e desrespeitando o estado de direito por razões políticas sem consequências.

Uma coisa é um ramo coigual do governo guardar zelosamente suas próprias prerrogativas. Mas quando a mais alta corte se torna aliada de políticos ideológicos e corruptos, a democracia corre um grave perigo. O Brasil chegou a esse momento.

Em um segundo turno em 30 de outubro, da Silva recebeu 50,9% dos votos contra 49,1% do presidente Jair Bolsonaro, que buscava um segundo mandato. O Sr. Bolsonaro nunca fez um discurso de concessão, mas instruiu seu governo a iniciar o processo de transição em Brasília. Está indo bem.

Alguns do lado perdedor não aceitaram a derrota com elegância, alegando, em vez disso, que a contagem dos votos foi fraudada. Houve marchas de protesto pacíficas nas grandes cidades. Um número menor de opositores de Lula destruiu propriedades e entrou em confronto com policiais e militares na tentativa de interromper a transferência de poder.

Mas os brasileiros rejeitam amplamente a violência, e a liderança da direita reconhece o Sr. da Silva como o vencedor legal da eleição. As forças armadas permanecem firmemente do lado da constituição.

Dito isso, a questão do tribunal superior politizado continua sendo uma ferida aberta para um público que está perdendo rapidamente a confiança em suas instituições.

A decisão da Suprema Corte brasileira de 2019 – por uma estreita maioria – para libertar o Sr. da Silva da prisão chocou a nação. O público aplaudiu os promotores que o condenaram em 2017 por acusações de corrupção e que desvendaram um esquema de propina multimilionário mais amplo orquestrado por seu Partido dos Trabalhadores. O enorme escândalo envolveu empresários, parlamentares de ambos os lados, a estatal petrolífera, o banco nacional de desenvolvimento e muitos governos estrangeiros.

As provas contra Lula eram sólidas e sua condenação havia sido confirmada por dois tribunais de apelação. Mas o tribunal superior reverteu seus próprios precedentes e anulou a decisão. Ele sabia que o estatuto de limitações não deixava tempo para um novo julgamento. Lula foi solto, mas nunca exonerado.

O ativismo judicial não parou por aí. Durante a campanha mais recente, o tribunal eleitoral do país – que incluía três juízes do Supremo Tribunal – censurou os críticos de Lula, incluindo um ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, que apontou que o candidato foi libertado por um tecnicismo, mas não foi inocentado.

O mesmo tribunal também censurou outros discursos políticos de líderes empresariais, membros eleitos do Congresso e plataformas de notícias e entretenimento da direita. Isso foi feito com a ajuda da “assessoria especial para combater a desinformação” do tribunal eleitoral. Atua como um ministério da verdade.

Alguns democratas brasileiros estão otimistas com o novo governo Lula porque seu Partido dos Trabalhadores não controlará o Congresso, que é responsável pelo orçamento. No entanto, um ministro da Suprema Corte já afirmou que o Congresso não tem poder para usar um teto para negar aumentos em certos gastos com previdência que Lula deseja. Isso é absurdo – como nos EUA, a Constituição brasileira dá aos legisladores o poder da bolsa. Mas na semana passada o Congresso cedeu à pressão e removeu o limite.

Lula é um político esperto e vai querer reconstituir uma rede multipartidária de legisladores que o deixarão fazer o que quiser, desde que os negocie. Tudo indica que o STF está pronto para ajudar usando seu poder, incluindo o ameaça de processo criminal, para pressionar os legisladores que hesitam em cooperar.

As preocupações de Fraga estão na frente fiscal. “Vejo ideias antigas que nunca funcionaram para nós”, disse ele à Bloomberg Línea em entrevista no Rio de Janeiro publicada na semana passada. “Estamos prestes a ver uma expansão fiscal maciça em uma economia que não está mais em crise.” Novos estímulos que poderiam aumentar o déficit orçamentário primário para 2% “não fazem sentido”, disse Fraga.

Eventualmente, Lula ficará sem dinheiro de outras pessoas. Mas isso dificilmente pode ser um conforto para aspirantes a brasileiros.


Publicado em 29/12/2022 08h22

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